água tinta, água forte, chine-collé,
tintas Charbonnel e Arttools sobre papel
água tinta, água forte, chine-collé,
tintas Charbonnel e Arttools sobre papel
linóleo, água tinta, água forte, chine-collé, carimbos,
tintas Charbonnel e Arttools sobre papel
MÁQUINA 1
água tinta, água forte, chine-collé,
tintas Charbonnel e Arttools sobre papel
Velin Johannot 340g/m²
67x50cm
MÁQUINA 2
água tinta, água forte, chine-collé,
tintas Charbonnel e Arttools sobre papel
Velin Johannot 340g/m²
67x50cm
ORGANIZANDO PARA DESORGANIZAR 1
água tinta, água forte, chine-collé,
tintas Charbonnel e Arttools sobre papel
Velin Johannot 340g/m²
67x50cm
ORGANIZANDO PARA DESORGANIZAR 2
água tinta, água forte, chine-collé,
tintas Charbonnel e Arttools sobre papel
Velin Johannot 340g/m²
67x50cm
“cadê as notas que
estavam aqui?
Não preciso delas
Basta deixar soando bem aos ouvidos”
Chico Science
A planície costeira onde a cidade de Recife foi fundada é cortada por seis
rios. Após a expulsão dos holandeses no
século XVII a (ex)cidade “maurícia” passou a crescer desordenadamente às custas do aterramento indiscriminado e
desordenado dos seus mangues. Em contrapartida, o desvairio irresistível de uma
única noção de progresso, que levou a cidade ao ponto de “metrópole” do nordeste
não tardou a revelar sua fragilidade. Bastam pequenas mudanças nos “ventos” da
história para que os primeiros sinais de esclerose econômica se manifestassem,
no início dos anos 60. Nos últimos trinta anos a síndrome da estagnação aliada a permanencia do mito de “metrópole”, só tem
elevado ao agravamento acelerado do quadro de miséria e caos urbano. O
Recife detém hoje o maior índice de desemprego do país, Mais da metade dos seus
habitantes moram em favelas e alagados. É hoje a quarta pior cidade do mundo para
se viver (SCIENCE, Chico ... e Nação
Zumbi: Da Lama ao Caos (encarte). Recife: Caos Record: 1994: digital, estéreo
[grifo meu]).
Natal caminha para um quadro
semelhante. O capital estrangeiro aliado a falta de políticas públicas comprometidas,
aportadas por uma visão de evolução baseada no “mascaramento” dos problemas
sociais e ambientais, parece guiá-la engatinhar para a “metrópole”. Uma cidade
que importa-se com o turismo e com as divisas que esta prática traz a cidade. Esquecendo-se
dos valores socio-ambientais e se afastando-se da história e de sua cultura.
Fagocitando todas as influências extrangeiras e negando sua cultura e suas
manifestações folclóricas. A cidade se esparrama pelo solo e cobre com seu
tecido cinza e poluidor em uma velocidade assustadora sem se importar com o que
encobre pelo caminho, sem observar como isto ocorre e suas consequências.
Os mangues estão entre os ecossistemas mais produtivos do
mundo. Estima-se que duas mil espécies de microorganismos e animais vertebrados
e invertebrados estejam associados a vegetação do mangue. Os estuários fornecem
áreas de desova e criação para dois terços da produção anual de pescados do
mundo inteiro. Pelo menos oitenta espécies, comercialmente importantes dependem
dos alagadiços costeiros. Não é por acaso que os mangues são considerados um
elo básico da cadeia alimentar marinha.
Ouvir o som e transformá-lo em forma. Ver a forma e
tentar transformá-la em som. Sinestesia. As gravuras apresentadas são de uma
série produzidas na Faculdade de Belas Artes do Porto, na disciplina Obra
Gráfica, sob a orientação da professora Graciele Machado e do Técnico Avelino
Guedes. Trata-se de experimentos e imagens únicas com a associação de matrizes.
Água forte, água tinta, relevo seco, serigrafia, carimbos, chiné-colle,
fotogravura. Unindo técnicas e tentando subverter o caráter de multiplicidade
pelo anulamento de registros, ou simplesmente pela não utilização. As imagens
criadas recorrem a sobreposição de impressões e de cores como fim a criação de
composições mais “estáveis”. O processo de confecção das matrizes por
fotogravura com fotocópias é um processo que versa sobre a anulação de parte da
imagem e como, de certa forma, houve quase a total transferência imagética, o
processo parece ter se encarregado da degradação da imagem com a retirada de
matéria do papel. A tentativa de apagar ou de driblar o acidente parece não
muito eficaz, conferindo a imagem um caráter de “único”.
As imagens construídas remetem a dicotomia entre o
artificial e o natural. O mangue e seus habitantes decápodes, a flora vegetal e
sua fragmentação. E a construção arquitetônica, a fuga animal e a
coleta sonora. A transformação das estruturas de lama em estruturas de concreto
armado. A coleta da imagem e a máquina transformadora em sons. Sons que trazem
do mangue seu ritmo e significância a dureza cinza da cidade. O processo de
confecção das matrizes pode revelar-se artificial pela utilização de
substâncias químicas e materiais industrializados (placas de alumínio), o que
confere ao trabalho uma nova questão sobre o que é realmente natural e o que é
artificial. Mas o que importa, realmente, neste momento, é a construção da
imagem enquanto poética pessoal e experiência produtiva gráfica, na construção
de um discurso visual afim ao caráter das estéticas sinestésicas do manguebeat,
alinhando o trabalho ao carácter musical-experimental que John Cage propõe em
sua produção, mas de forma inversa com a audição de músicas e posterior criação
de imagens. Que o mangue permaneça vivo e que se possa coexistir com sua
estrutura frágil de lama e que a cidade com sua dureza-cinza ache novas formas
e políticas alinhadas ao desenvolvimento socio-ambiental.
Artur Souza, 2009